Em política, como na vida, a realidade se impõe avassaladoramente e derruba as ilusões daqueles que se recusam a reconhecê-la a tempo de se corrigir e se reposicionar. Assim é, inclusive, para Bolsonaro, que insiste em acreditar numa presidência mítica e uma recondução automática ao segundo mandato. Vejamos o que dizem os fatos.
O presidente Jair Bolsonaro tem um voto cativo vindo, principalmente, de pessoas com boas condições de vida, um grupo confiante e barulhento, estimado em 35 milhões de eleitores. Mas do outro lado, além dos históricos militantes de esquerda, vem se formando um antibolsonarismo, que reúne desempregados, pobres, parentes e vítimas da pandemia, funcionários públicos, professores e, ainda, alguns empresários e seus familiares cansados da crise econômica, da falta de vacinação e do estilo destemperado do presidente. Este contingente, hoje, é estimado em 70 milhões de votos.
Diante de um cenário com tamanha diferença a favor de seus opositores, é inútil e perda de tempo Bolsonaro insistir na discussão sobre urna eletrônica e voto impresso. Qualquer possibilidade de fraude seria muito inferior ao número de votos contra que Bolsonaro enfrenta atualmente.
Agora é o momento de o presidente concentrar toda a sua energia em apresentar resultados e corrigir os erros do governo para não perder mais apoio e ainda reconquistar os eleitores insatisfeitos.
Se Bolsonaro e seus seguidores se apegarem a esse debate sobre voto impresso, deixarão de administrar o país corretamente. Em vez de criar problemas, é preciso enfrentar os desafios reais e urgentes como a vacinação em massa, os investimentos em infraestrutura, as privatizações e a consolidação da recuperação da economia.
As recentes pesquisas de opinião mostram claramente o que deve ser feito e alertam que uma deterioração muito forte da imagem do presidente pode se tornar irreversível. Pesquisas são um retrato instantâneo da realidade imediata, ou seja, elas também avisam que, se for feita uma correção de rumos, dá tempo de virar o jogo.
O presidente Jair Bolsonaro tem tudo para recuperar a credibilidade do governo e conquistar a reeleição. Seu projeto liberal é o melhor que o Brasil já teve nas últimas décadas. A equipe de governo é competente e o presidente, além de compromisso, tem um amor genuíno pelo povo brasileiro. Para tudo isso não se perder, Bolsonaro tem que acordar e reconhecer os desafios que a realidade está impondo.
O presidente precisa, urgentemente, tomar as medidas que podem fazer bem à sua imagem:
1 - Adotar um posicionamento público de apoio à vacinação em massa e trabalhar para conseguir as vacinas.
2 - Adotar o uso de máscara em eventos públicos.
3 – Determinar a privatização em massa de estatais, com destinação de parte dos recursos para a população mais pobre a partir de um novo e mais musculoso programa social. Outra parte dos recursos deve ser investida em infraestrutura e em amortização da dívida pública.
A solução está ao alcance do presidente. Mas não tem outra saída. Se quiser vencer as eleições de 2022, tem que agir com firmeza e precisão sem distrações com disputas inúteis e desgastantes.
Bolsonaro tem que olhar além do círculo palaciano onde bajuladores e radicais de direita o impedem de ver a realidade. Um exemplo são as motociatas, que não passam de ilusão, pois só reúnem homens bem de vida e de direita.
Para que tenham impacto real, as manifestações precisam contar também com desempregados, pobres, favelados e demais eleitores que se beneficiam de políticas do governo, mas, neste momento, estão compondo a grande massa antibolsonarista identificada nas pesquisas.
Outra ilusão é acreditar que Lula não tem voto porque não tem público ao lado dele em grandes manifestações públicas. A militância lulista não está nas ruas por falta de dinheiro. Eles perderam os cargos, as receitas do sindicalismo e todo o apoio financeiro que o governo dava para suas organizações sociais. Estão sem verba para bancar mobilizações em massa, mas não estão mortos. Ledo engano acreditar que Lula não tem voto.
Bolsonaro, por sua vez, tem uma militância aguerrida, bem de vida, composta de empregados, empresários, investidores - grupo que se mobiliza facilmente - dando ao mito a ilusão de poder e glória.
Como dito antes, a realidade se impõe e, para os políticos, é nas urnas que ela se materializa. Melhor agir agora, pois não vai adiantar chorar mais tarde.
Clésio Andrade, empresário, empreendedor social, foi vice-governador de Minas Gerais, ex-senador, ex-presidente da CNT - Confederação Nacional do Transporte e fundador do SEST SENAT
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